Traço de Giz – Encontros e desencontros!

Sempre há aqueles quadrinhos sobre os quais ouvimos falar de forma bastante elogiosa, mas que, pela falta de publicação no Brasil, não temos a oportunidade de ler estas obras, mesmo que sejam multipremiadas e que sua não publicação por aqui seja inexplicável. Traço de Giz, quadrinho escrito e desenhado pelo espanhol Miguelanxo Prado, era uma dessas obras e, felizmente, essa lacuna foi preenchida pela publicação da editora Pipoca e Nanquim.

Traço de Giz conta a história de Raul, que estava navegando em seu barco até que uma tempestade o atinge, o deixa à deriva e o leva a uma ilhota que não consta em nenhum mapa. Lá ele encontra um velho farol desativado, dois habitantes, uma estalagem e um muro com estranhas mensagens. Raul percebe que sua embarcação não é a única no cais e acaba conhecendo a misteriosa Ana, por quem se sente atraído imediatamente. Entretanto, o navegante começa a se questionar sobre os mistérios presentes naquela ilha: qual o propósito de uma estalagem sem clientes no meio do nada? Por que há tantas gaivotas mortas? Quem é Ana? E por que dizem que a chegada de uma terceira embarcação à ilha significa o prenúncio de uma tragédia? Contar mais que isso pode acabar estragando sua experiência.

O roteiro de Miguelanxo Prado é uma das coisas mais geniais que já tive contato nesta mídia. O autor apresenta uma trama envolvente que inicialmente parece não ter nada demais, mas que vai aos poucos intrigando o leitor com seus mistérios e suas respostas. Uma sensível história sobre encontros e desencontros que lhe entrega mais conforme você procura. Adianto que é muito pouco provável que você absorva a grandiosidade de Traço de Giz em apenas uma leitura, será necessário que você revisite o quadrinho para captar todas as nuances da história. Um trabalho digno de um gênio, sem dúvida.

Quanto à arte, Prado tem um traço belíssimo, cada quadro desenhado por ele parece uma pintura do pintor francês Claude Monet, e também é repleta de detalhes que complementam o roteiro como uma obra única, exigindo a atenção do leitor a cada mínimo detalhe. Sua narrativa conduz o leitor a uma viagem pela ilha, que muitas vezes apresenta um aspecto onírico, mas que se torna cada vez mais real a cada virada de página, principalmente em seus momentos mais sombrios.

Todos os elogios que você está lendo neste texto não representam apenas os pensamentos deste resenhista, mas também de boa parte da crítica internacional. Por Traço de Giz, Miguelanxo Prado recebeu o prêmio de Melhor Álbum Estrangeiro no Festival de Angoulême, melhor Álbum no Salão de Quadrinhos de Barcelona e também indicações aos prêmios Eisner, na categoria Melhor Pintor/Artista Multimídia, e Harvey, na categoria Melhor Quadrinho Estrangeiro. Como você pode perceber, essa é uma obra que faz sucesso onde quer que seja publicada.

O trabalho gráfico da editora Pipoca e Nanquim é sempre digno de elogios, e aqui não é diferente. A publicação tem capa dura, papel couché de boa gramatura e ótima qualidade de impressão, que valoriza o trabalho do artista. Além disso, no que tange á questão editorial, a editora apresenta um competente trabalho de tradução e revisão e extras que complementam muito bem a obra, como esboços do artista, suas ideias para a obra, uma singela homenagem à Hugo Pratt e um prefácio escrito por Sidney Gusman, um dos grandes divulgadores do trabalho de Prado por aqui, no qual ele comenta sobre a importância da obra e seu impacto em sua trajetória como leitor de quadrinhos. Há também uma completa biografia do autor para que aqueles que não o conheçam tenham a compreensão do quão grandioso é seu trabalho.

Traço de Giz, embora o 2021 esteja apenas começando, é um dos melhores lançamentos deste ano. Um quadrinho que merece ser descoberto, lido e relido para que possa ser decifrado. Fico feliz que finalmente os leitores brasileiros tenham a oportunidade de ter contato com o trabalho de Miguelanxo Prado de forma mais consistente. Espero que essa seja a primeira publicação de muitas.

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Ficha técnica

Editora: Pipoca e Nanquim
Tradução: Daniel Lopes
Ano de lançamento: 2021
Páginas: 108
Preço: R$ 64,90

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Lucas Araújo

Programador, estudante de TI e co-fundador do Justiça Geek. Fanático por quadrinhos, aficionado por filmes e séries, leitor faminto, gamer esporádico e músico (muito) frustrado. Gosta de falar sobre tudo isso em seu tempo livre(ou até mesmo quando não está tão livre...), debatendo questões essenciais para a humanidade como quem vence um crossover entre super- heróis, qual é seu escritor favorito e se um filme foi bem feito.