Pai de Mentira – Uma conturbada relação entre pai e filho permeada por quadrinhos!

Quando as editoras brasileiras resolvem apostar em novos autores nunca publicados por aqui, sempre fico animado em ler as obras que trazem mais pluralidade ao mercado, já que que muitas vezes elas procuram publicar velhos conhecidos buscando garantia de vendas em um mercado que é bastante difícil. Em Pai de Mentira, quadrinho publicado por aqui pela editora Comix Zone, conhecemos Joe Ollmann e não poderíamos ter melhor cartão de visita desse autor canadense.

Nesse quadrinho acompanhamos da história de Caleb, um pintor de meia idade que tem um passado conturbado e cujo a carreira nunca deslancha. Ele é filho de um famoso quadrinista, Jimmi Wyatt, autor da famosa tirinha Chapa & Chapinha, que fala sobre uma doce e sensível relação entre pai e filho. Entretanto, Jimmy e Caleb possuem uma relação conflituosa, que em nada lembra os personagens da tira, em que o pai é uma figura desprezível que pouco se importa com esposa e filhos, e o filho tem traumas de infância que o fizeram tomar diversas decisões erradas ao longo da vida. Mas quando Jimmy falece, Caleb decide assumir a tirinha do pai, como uma espécie de tentativa de reconexão com seu passado e sua figura paterna, mas irá descobrir como funciona a criação de uma tira diária, cheia de desafios, e como seu relacionamento com os quadrinhos foi importante em diversos momentos de sua vida.

A trama criada por Joe Olmann chama a atenção por diversos aspectos. Além de explorar uma conturbada relação entre pai e filho de forma muito humana e às vezes bem-humorada, contrastando leveza com temas pesados, também apresenta uma verdadeira aula sobre quadrinhos, com o foco em tiras diárias. Há tantos detalhes sobre Chapa & Chapinha que você realmente acredita que ela existiu, mas também são mostrados curiosidades sobre tiras e autores que de fato existiram, além de um retrato sobre o cenários do quadrinho underground norte-americano dos anos 70 e 80, que são um verdadeiro deleite para quem é fã da mídia. Lembra o que Art Spiegelman fez em Maus, em que ele fala sobre o processo de criação e publicação da obra ao mesmo tempo em que relata a relação com seu pai e os horrores do holocaustro, mas sem o aspecto autobiográfico e a visceralidade que era necessária devido à temática da obra.

O autor sabe como conduzir a história com uma narrativa incisiva e sem grandes arrojos visuais, com um traço muito característico que ele vai alterando conforme as obras que ele vai representando ao longo da trama, demonstrando toda sua versatilidade como artista. Há uma certa leveza na condução da  obra, mesmo com temas pesados com os quais ela lida, Ollmann sabe como equilibrar entre drama e humor para não deixar a obra muito densa.

A publicação da Comix Zone tem capa dura, papel offset e um glossário extraordinário elaborado pelo tradutor e jornalista Érico Assis, em que ele comenta de forma mais detalhada vários autores e acontecimentos que são apresentados ao longo da história. Esse tipo de extra sempre merece ser elogiado pois engrandece a experiência de leitura.

Pai de Mentira é uma obra que pode ser enxergada de várias formas: A conflituosa relação entre pai e filho que tem os quadrinhos como elemento fundamental, uma aula sobre a produção de uma tira diária, um retrato do quadrinho underground norte-americano, um autor demonstrando todo seu talento. Independente de como você encare, é uma obra impactante, uma leitura mais do que recomendada. Espero que tenhamos mais obras de Joe Ollmann por aqui, é um autor que parece ter muito a dizer.

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Ficha técnica

Editora: Comix Zone
Tradução: Érico Assis
Ano de lançamento: 2022
Páginas: 216
Preço: R$119,90

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Lucas Araújo

Programador, estudante de TI e co-fundador do Justiça Geek. Fanático por quadrinhos, aficionado por filmes e séries, leitor faminto, gamer esporádico e músico (muito) frustrado. Gosta de falar sobre tudo isso em seu tempo livre(ou até mesmo quando não está tão livre...), debatendo questões essenciais para a humanidade como quem vence um crossover entre super- heróis, qual é seu escritor favorito e se um filme foi bem feito.