Eu geralmente não gosto de adaptações de grandes clássicos literários em quadrinhos, mesmo já tendo lido alguns excelentes exemplares deste tipo de obra. Grande parte dessas adaptações suprimem muito a obra original, simplificam mensagens, perdem a sutileza e possuem um trabalho de arte simplório, mas talvez seja um estereótipo criado devido a quantidade de adaptações desse tipo que lemos em nosso tempo de escola. O trabalho de adaptar o clássico Moby Dick realizado pelo francês Christophe Chabouté rompe este estereótipo e se apresenta como uma das melhores HQs publicadas esse ano em nosso país.
Você deve conhecer Moby Dick, o famoso livro escrito por Herman Melville que retrata a obsessão do capitão Ahab em caçar uma cachalote branca. Este livro está em tudo quanto é lista de melhores romances já escritos, devido às diversas nuances que a história apresenta, o que vai muito além de uma simples caça à baleia. Mesmo que você não tenha lido o livro, assim como eu ainda não tive a oportunidade de ler, com certeza já viu alguma adaptação ou citação, seja em algum filme ou em desenhos como Simpsons e Bob Esponja.
Pois bem, Chabouté assumiu a difícil tarefa de adaptar este grande clássico para os quadrinhos. O desafio se tornou ainda mais intenso pois o artista resolveu utilizar o texto original da obra na construção do quadrinho, seja nos diálogos ou na construção de cenas famosíssimas. E devo dizer, sem sombra de dúvida, que o cara conseguiu atingir qualquer expectativa que um leitor poderia imaginar, pois este quadrinho é uma das coisas mais bonitas que eu já vi.
Chabouté é um mestre na narrativa visual, seus personagens são muito expressivos, seus cenário são super detalhados e a capacidade que ele tem em trabalhar o silêncio no quadrinho é raramente encontrada em artistas dessa mídia. O cara tem que manjar muito de narrativa para poder trabalhar uma cena completamente sem diálogos e Chabouté faz isso com maestria.
Como eu mencionei em um texto lá no Cena Medieval, o artista realmente tem que ser bom pra poder se manter no mercado europeu e este Francês segue esta regra à risca. Ele já foi premiado em Angoulême algumas vezes, um dos principais festivais de quadrinhos do mundo, em uma carreira que já dura 20 anos.
E aí vem um questionamento: Como um cara tão talentoso e renomado nunca havia sido publicado aqui no Brasil? Um de seus maiores fãs que eu conheço, o editor-chefe do Universo HQ e das Graphic MSP, Sidney Gusman, mencionava o nome de Chabouté sempre que o assunto quadrinho europeu vinha à tona. Ainda bem que o pessoal da editora Pipoca e Nanquim estava ligado no trabalho deste artista e trouxe este excelente trabalho para o mercado brasileiro.
Aliás, é muito curioso o caso da transformação do Pipoca e Nanquim em editora. Os caras são um dos maiores canais de quadrinhos do Youtube, e também um dos mais antigos, e com muito trabalho conseguiram montar a própria editora. Bruno Zago, Alexandre Callari e Daniel Lopes já possuíam experiência como editores na Panini e demonstram em Moby Dick que realmente sabem o que estão fazendo. Editorialmente o trabalho também é belíssimo, como a obra merece, apresentando um excelente acabamento em capa dura, ótima qualidade de papel, impressão nítida e uma lombada arredondada que se destaca ao lado de outras obras. Eles merecem os parabéns por já terem atingido este patamar em seu terceiro lançamento (os outros dois foram Espadas e Bruxas, de Esteban Maroto, e Cannon, de Wallace Wood).
E o quadrinho não tem pontos negativos? Bem, sinceramente eu não tenho nada a apontar neste aspecto, porém sobre a questão editorial devo apontar um problema, mesmo que seja bem pequeno: Ao final da obra, existem duas biografias bem curtas, uma de Chabouté e outra de Herman Melville. Na biografia de Melville existem datas incorretamente atribuídas ao século XX quando na verdade deveriam se referir ao século XIX. Nada que prejudique a edição em si, mas fica aqui o leve puxão de orelha.
Eu recomendo que você leia este quadrinho, pois ficará maravilhado com a arte de Chabouté e se tornará um fã dele assim como aconteceu comigo. Ele mantém todas as sutilezas e significados da obra original, ao mesmo tempo que traz uma nova vida à essa história. Vou correr para ler o livro e poder refletir ainda mais sobre o trabalho. Espero que as editoras brasileiras deem mais atenção ao trabalho de Chabouté e que possamos ver muitos deles publicados por aqui.
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Ficha técnica
Editora : Pipoca e Nanquim
Ano de lançamento: 2017
Páginas: 256
Preço: R$ 120,00
Lucas Araújo
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