A Grande Farsa – Noir com tempero latino!

Já comentei por aqui como é curioso que quadrinhos sul-americanos, mesmo com a proximidade geográfica, não costumam ser tão populares por aqui quanto europeus, americanos e japoneses. Felizmente temos algumas editoras buscando resgatar esses quadrinhos e mudar esse cenário, já que há verdadeiras joias em meio ao que é produzido por nossos vizinhos de continente. Este é o caso de A Grande Farsa, obra escrita por Carlos Trillo, ilustrada por Domingo Mandrafina e publicada por aqui pela editora Comix Zone.

A publicação em questão reúne tanto A Grande Farsa quanto sua continuação, O Iguana. O primeiro álbum narra uma trama que se passa numa república das bananas não tão imaginária assim, que é comandada por um ditador sanguinário que mantêm uma relação incestuosa com sua sobrinha. Esta sobrinha finge ser uma virgem milagrosa para a população e acaba sendo envolvida em uma chantagem baseada em fotos comprometedoras, tendo que pedir ajuda para um ex-policial alcoólatra a fim de evitar um grande escândalo. Eles acabam tendo que confrontar o sádico Iguana, o temido torturador oficial do regime ditatorial em vigor. Já o segundo álbum narra um pouco da história do terrível torturador e as repercussões ocorridas na primeira história.

Carlos Trillo honra a fama da grande qualidade que os roteiristas argentinos apresentam em suas obras, sendo considerado um dos maiores escritores de quadrinhos surgidos no país. Sua habilidade em misturar o clima noir com a ambientação tão familiar a qualquer habitante de nosso continente é realmente impressionante. O autor também é muito competente no desenvolvimento narrativo da obra, numa constante quebra da quarta parede através de personagens secundários para contar a história, algo que é quebrado na segunda parte, mas que mesmo assim não se torna comum. Além disso, há o forte contorno político na trama que tece duras críticas aos sofrimentos pelos quais todos os países do nosso continente passaram, coisa que raramente encontraremos em algo produzido em outros lugares do globo. Não é por acaso que Trillo foi contemplado com o prêmio de melhor roteiro no festival de Angoulême, na França, um dos mais renomados do mundo.

Domingo Mandrafina é um verdadeiro gigante do traço, com uma habilidade ímpar no estilo chiaroscuro. Além dos belos desenhos, ele apresenta um trabalho narrativo sublime, com a utilização de ângulos cinematográficos que remetem aos filmes dos anos 50 e o uso de uma curiosa técnica para demonstrar a alternância entre passado e presente, ao tornar seu traço mais leve para ilustrar recordatórios. É também importante ressaltar o trabalho de colagem que ele utiliza em O Iguana, o que demonstra que Mandrafina está sempre disposto a experimentar para que seus desenhos nunca pareçam acomodados.

A edição da Comix Zone possui excelente acabamento, com capa dura e papel de ótima qualidade, o que é essencial para que a arte desse estilo seja melhor apreciada. Além do cuidado editorial, há um ótimo prefácio de Paulo Ramos, um dos maiores especialistas em quadrinhos argentinos do Brasil, que ajuda a contextualizar a obra, alguns estudos de página feitos por Mandrafina e a biografia dos autores, algo que sempre chamo a atenção em meus textos por ser essencial para que o leitor conheça os responsáveis pela obra e sua importância.

A Grande Farsa é um quadrinho indispensável para qualquer apreciador de boas histórias, sem dúvidas um dos melhores lançamentos deste ano. Espero que as editoras continuem investindo nos quadrinhos produzidos por nossos vizinhos sul-americanos, é visível que há muita qualidade no que é produzido em nosso continente e muita coisa ainda é inédita por aqui.

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Ficha técnica

Editora: Comix Zone
Tradução: Jana Bianchi
Ano de lançamento: 2020
Páginas: 224
Preço: R$ 89,90

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Lucas Araújo

Programador, estudante de TI e co-fundador do Justiça Geek. Fanático por quadrinhos, aficionado por filmes e séries, leitor faminto, gamer esporádico e músico (muito) frustrado. Gosta de falar sobre tudo isso em seu tempo livre(ou até mesmo quando não está tão livre...), debatendo questões essenciais para a humanidade como quem vence um crossover entre super- heróis, qual é seu escritor favorito e se um filme foi bem feito.