A Menor Distância Entre Dois Pontos É Uma Fuga – Um projeto gráfico a serviço de uma bela história!

É impressionante o quão pouco sabemos sobre nossa história como povo brasileiro. Seja por lacunas no sistema educacional, seja por falta de interesse, não seria leviano afirmar que os brasileiros sabem mais sobre a história de outros países do que sobre seu próprio. Felizmente, há alguns autores interessados em contar mais histórias sobre o Brasil, até mesmo sobre alguns acontecimentos que foram deliberadamente ocultados para evitar debates importantes em nossa sociedade. É o que acontece em A Menor Distância Entre Dois Pontos É Uma Fuga, quadrinho escrito e desenhado pela dupla Gabriel Nascimento e João Henrique Belo.

A sinopse da obra é simples, mas muito intrigante: Numa manhã de junho de 1944 o navio militar americano W. A. Mann está preparado para se lançar ao mar rumo ao antigo continente europeu. Entre seus passageiros um jovem se encontra completamente deslocado entre aquele mar de pracinhas recém recrutados. Numa pequena cidade interiorana, uma mulher parte para uma jornada dupla de trabalho. Durante o dia, atende os clientes de um pequeno bar. À noite, dança em uma decadente casa noturna da cidade. Um homem passa os dias internado em um hospital psiquiátrico buscando de alguma forma se encontrar em meio a confusão mental que o atormenta. Todos eles buscam alguma forma de enfrentar seus problemas e, em alguns momentos, a fuga é a única tangente possível.

Em uma história sem qualquer balão de fala, Gabriel e João conseguem dizer muito em uma trama que mistura a história do Brasil com questões de gênero e preconceito, emocionando o leitor a cada virada de página a medida em que vai compreendendo o que de fato está acontecendo. Aliás, os autores fazem com que o leitor participe da história, já que é ele que terá que desvendar como as histórias de personagens aparentemente tão distintos estão ligadas. Tudo contado de forma muito sensível e brilhante.

Por falar em um trabalho brilhante, é preciso destacar não só o trabalho de arte como o design gráfico atrelado à narrativa. Os autores alternam não só na questão narrativa na história de cada personagem, mudando a disposição de quadros, mas também mudam a cor das páginas, o que adiciona mais uma camada à história, já que cada cor utilizada tem relação direta com a história do respectivo personagem. Isso traz uma dinâmica para obra que a distingue de qualquer outra, preciso dizer que eu só vi esse tipo de sofisticação de utilização do design gráfico do quadrinho na história em obras de autores no nível de Alan Moore. E olha que, modéstia à parte, já li muito quadrinho nessa vida.

A obra foi publicada de forma independente através de financiamento coletivo e dispositivos de fomento à cultura do Governo Federal e do Governo de Minas Gerais. Os extras disponíveis envolvem um belo texto de Gabriel Amato, historiador e professor da IFSULDEMINAS, em que ele comenta sobre os silêncios da história que esse quadrinho quebrou, e também um texto no qual os autores detalham seu processo criativo, muito interessante por sinal, que envolveu também o trabalho de Eduardo Damasceno e Nilo Siqueira na edição. A única coisa que me incomodou, e nem é algo de fato relevante, é que faltou colocar o título da obra na lombada para tornar mais fácil sua identificação em prateleiras.

A Menor Distância Entre Dois Pontos É uma Fuga é aquele tipo de trabalho que demonstra toda a força dos quadrinhos como mídia e como certas histórias podem apenas ser contadas através dos recursos disponíveis nos quadrinhos. Embora sem falas, é uma obra que traz voz a quem por muito tempo não teve o direito de se expressar e pode ajudar a abrir os olhos de muita gente. Simplesmente indispensável, não perca a oportunidade de ler.

Você pode adquirir a publicação diretamente com os autores clicando AQUI

Ficha técnica

Editora: Publicação independente
Ano de lançamento: 2021
Páginas: 140
Preço: R$50,00

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Lucas Araújo

Programador, estudante de TI e co-fundador do Justiça Geek. Fanático por quadrinhos, aficionado por filmes e séries, leitor faminto, gamer esporádico e músico (muito) frustrado. Gosta de falar sobre tudo isso em seu tempo livre(ou até mesmo quando não está tão livre...), debatendo questões essenciais para a humanidade como quem vence um crossover entre super- heróis, qual é seu escritor favorito e se um filme foi bem feito.